Já parou para refletir qual é a origem da culinária caipira? Será mesmo que é uma prática alimentar pertencente apenas ao estado de Minas Gerais ou do interior de São Paulo, ou de Goiás?
A proposta desse conteúdo é fazer uma viagem no tempo para trazermos a origem de práticas alimentares e mesmo, com a vida moderna, vencer essa ruptura e estreitar laços com essa diversidade alimentar do nosso passado.
Nossa história começa na época da colonização no Brasil, na região denominada pelos portugueses como Paulistânia, um território original dos indígenas Guaranis.
A área da Paulistânia correspondia do leste de Minas Gerais até o Mato Grosso, do Jalapão e Goiás até Santa Catarina e parte do Rio Grande do Sul, passando, obviamente, pelo que hoje é o estado de São Paulo.
O “ser caipira” não segue um padrão étnico e tão pouco é um adjetivo pejorativo, segundo o sociólogo Antônio Cândido: “o caipira é o resultado do ajustamento do colonizador ao novo mundo, tanto pela manutenção dos traços de origem, quanto pela transformação no contato com os indígenas. O caipira é, portanto, o homem tradicional do campo.”
Os hábitos indígenas têm forte influência na prática alimentar caipira. A caça de porco, extração de mel, pesca de peixes, coleta de milho e da mandioca e outros legumes garantiam o sustento das viagens da Paulistânia para o Sertão Nordestino.
Segundo o sociólogo Antônio Candido, autor do livro "Os parceiros do Rio Bonito", obra que analisa a alimentação dos caipiras, a primeira refeição do dia era composto por café simples—água fervida com quantidade de pó variável e adoçado com açúcar—, era preparado bem cedo.
Depois, o caipira partia para a roça levando consigo o que seria seu almoço e sua merenda, acompanhados de mais café. O almoço era consumido entre 8h30 e 9 horas e, a merenda, às 12 horas.
Esta geralmente era a sobra do almoço, na qual estava presente a comida— o arroz, o feijão, a farinha de milho e a mistura ,em quantidade consideravelmente pequena na alimentação do caipira, no almoço ou no jantar.
A mistura podia ser composta por verdura, ovo, pão ou carne, raramente associados. Logo, a base da alimentação do caipira era a combinação de feijão, arroz e farinha de milho.
O feijão, apesar de ralo, vinha primeiro, mas não em ordem de quantidade e sim de importância, porque ele era o chefe da mesa, considerado fundamental para o caipira.
A influência urbana devido à modernização do país com influência européia (portugueses, italianos e espanhóis) e norte-americana trouxe novos hábitos para o país.
A banha de porco, muito utilizada para conservação de alimentos, foi substituída por ultraprocessados importados dos Estados Unidos, como a margarina. Os óleos vegetais foram introduzidos no lugar da banha no preparo dos alimentos.
Os hábitos caipiras, como por exemplo, de descascar arroz no pilão, foi substituído pela máquina de tratamento do grão. Os potes de barro, vasilhas de porunga, colheres de pau foram substituídos louças, panelas de ferro, alumínio e ágata.
Era necessário trabalhar para ter dinheiro. E o aumento nas horas de trabalho levou a necessidade do caipira comprar o que antes ele mesmo produzia. Com tantas transformações no meio de vida, o caipira migrou para a cidade.
A base de alimentação que era a mandioca e o milho foi diminuindo enquanto o trigo ia ocupando seu lugar.
Quando nos deparamos com um restaurante que tem na placa “comida mineira”, na maioria das vezes são oferecidos pratos que ainda possuem referência desse passado caipira.
Minas fazia parte do território da Paulistânia mas não era o único lugar onde se preparava comida caipira, no entanto teve um esforço do governo e de seus cidadãos para preservar o que sobrou dessa cultura caipira em oposição à cultura alimentar moderna e urbana que crescia e sofria forte influência dos novos imigrantes europeus, se americanizava e se industrializava, segundo os levantamentos do sociólogo Carlos Alberto Dória, é como se Minas houvesse se apropriado da memória que se apagou em São Paulo.
Houve uma transferência para Minas do conceito de cozinha caipira, que se fundiu e se confundiu com a mineiridades, mas essa cozinha sobrevive até hoje na memória, nos sítios e nas casas de goianos, paulistas, matogrossense e paranaenses, etc. É a culinária que representa a forma de viver do cabloco brasileiro, que com poucos recursos mas muita conexão com a natureza improvisou suas soluções de vida.